HISTÓRICO DA REDE PUXIRÃO

A emergência de identidades coletivas no Brasil nas últimas décadas tem revelado a existência de diversos grupos étnicos, organizados em movimentos sociais, que buscam garantir e reivindicar direitos, que sempre lhes foram negados pelo Estado. Desta forma, compreendem-se sem exaustão os motivos para o qual um país tão diverso em sua composição étnica, racial e cultural, a persistência de conflitos oriundos de distintas visões de mundo e modos de vida, que desencadeiam desde o período colonial, lutas pela afirmação das identidades coletivas, territorialidades especificas e reconhecimento dos direitos étnicos.



Na região Sul, especialmente no Paraná e Santa Catarina, a invisibilidade social é uma das principais características dos povos e comunidades tradicionais. Até pouco tempo atrás, a inexistência de estatísticas e censos oficiais fez com que estes grupos elaborassem seus levantamentos preliminares numa tentativa de afirmarem sua existência coletiva em meio a tensões, disputas e pressões que ameaçam seus diretos étnicos e coletivos garantidos pela Constituição Federal de 1988 e, diversos outros dispositivos jurídicos infraconstitucionais[1].



Destas demandas surge, na região Sul, a Rede Puxirão dos Povos e Comunidades Tradicionais, fruto do 1º Encontro Regional dos Povos e Comunidades Tradicionais, ocorrido no final do mês de Maio de 2008, em Guarapuava, interior do Paraná. Neste espaço de articulação, distintos grupos étnicos, a saber: xetá, guaranis, kaingangs, faxinalenses, quilombolas,benzedores e benzedeiras, pescadores artesanais, caiçaras, cipozeiras, religiosos de matriz africana e ilhéus; tais segmentos se articulam na esfera regional fornecendo condições políticas capazes de mudar as posições socialmente construídas neste campo de poder. Ademais, a conjuntura política nacional corrobora com essas mobilizações étnicas, abrindo possibilidades de vazão para as lutas sociais contingenciadas há pelo menos 3 séculos, somente no Sul do País.



segunda-feira, 31 de maio de 2010

Rede Puxirão reitera sua posição sobre as leis ambientais

Após o Seminário de Unidades de Conservação e Territórios de Povos e Comunidades Tradicionais realizado nos dias 21 e 22 de maio em Querência do Norte, Paraná, a Rede Puxirão está divulgando a Carta Final do envento. O documento reitera a posição da Rede sobre as leis ambientais do nosso país e pede aos legisladores que olhem com mais cuidado para a relação que os Povos e Comunidades Tradicionais têm com seus territórios:




CARTA FINAL

Nós, membros da Rede Puxirão de Povos e Comunidade Tradicionais – Benzedoras e Benzedores, Cipozeiros e cipozeiras, Faxinalenses, Ilhéus, Indígenas, Pescadores e Pescadoras Artesanais, Religiosos de Matriz Africana e Quilombolas – participantes do Seminário de Unidades de Conservação e Territórios de Povos e Comunidades Tradicionais, realizado nos dias 21 e 22 de maio de 2010, em Querência do Norte - PR, vimos por meio desta, reafirmar a nossa luta pelo reconhecimento e efetivação de direitos étnicos, culturais, territoriais e coletivos garantidos pelas normas internacionais, Constituição Federal, Leis e decretos Federais e Estaduais, por inúmeras vezes desrespeitados pela ação dos agentes do Estado.
Considerando que a legislação ambiental brasileira, a partir do SNUC, assume a qualidade de um instrumento de gestão ambiental participativa e democrática, que prima pelo engajamento da sociedade em suas decisões e reconhece a existência de povos e comunidades tradicionais como agentes da conservação ambiental, questionamos a postura predominantemente repressora dos gestores públicos ao operar a política ambiental no Estado do Paraná e no País, quando de sua relação com povos e comunidades tradicionais. Em que pese estes grupos culturalmente diferenciados serem os responsáveis diretos pela conservação dos recursos naturais, por meio de suas práticas tradicionais de uso da biodiversidade, a ação do Estado tem-se estabelecido contra essas comunidades conforme um padrão de relações sociais marcado, pelo desconhecimento de suas especificidades culturais e étnicas, observado no flagrante desrespeito à legislação concernente aos direitos de povos e comunidades tradicionais, assim como, por medidas repressivas presente na rotina das instituições e dos agentes públicos, onde prevalece o cerceamento das condições de reprodução social e física, especialmente na medida em que se estabelecem unidades de conservação de proteção integral sobre territórios tradicionais à revelia da existência social destes grupos sociais e de seus conhecimentos tradicionais.
Disso, tem resultado inúmeras medidas punitivas e a conseqüente criminalização de seus membros, qualificados como “agentes da degradação ambiental” de biomas que somente se mantém conservados pela presença dessas comunidades tradicionais. Ao fazer prevalecer medidas repressoras contra esses grupos sociais, as instituições ambientais tem sistematicamente condenado à destruição e ao desaparecimento os próprios recursos naturais, tal como observado no Parque Nacional e na APA da Ilha Grande, onde gradualmente a biodiversidade perde sua capacidade de homeostase, em razão do desequilíbrio ecológico provocado pela ausência dos principais sujeitos da ação ambiental e suas praticas tradicionais, ou seja, os ilhéus. Tem-se ainda, permanentes ações de degradação promovidas por “saqueadores” dos recursos naturais, que no momento, dado as medidas de deslocamento compulsório e restrições diversas que impedem a permanência dos ilhéus, não permitem sua ação protetora aos referidos recursos, como historicamente observou-se.
Reiteramos, assim, a necessidade de avançarmos na direção de medidas socioambientais operativas que contemplem a conservação da natureza em associação efetiva com direitos territoriais dos povos e comunidades tradicionais, uma vez que a realidade socioambiental reafirma esse pressuposto, visto que grande parte das áreas de preservação de matas nativas e recursos naturais no Estado do Paraná são as ocupadas pelas comunidades tradicionais, fica nítido que a matriz ecológica que orienta as praticas tradicionais destes grupos sociais, se distingue sobremaneira da visão ruralista, guiada pela ambição produtivista e mercantil, que tanta degradação tem ocasionado aos ecossistemas locais. Deste modo, provocamos esse momento, como iniciativa para encontramos o caminho da construção da natureza e do reconhecimento da diversidade sócio-cultural em nosso Estado e País.



Querência do Norte – 21 e 22 de maio de 2010.

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